sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Os Homens São Todos Iguais

Na hora "h" eu vou ter de contar. Não conseguirei esconder a verdade dele por mais tempo, mesmo querendo. Essa praia, noite estrelada em capacidade máxima, cheiro de flor, atabaques ao longe e o vento carregando toda essa atmosfera para dentro do apartamento em que estamos agora. E eu aqui, tendo de confessar para ele que... tão bonito, os enormes olhos castanhos cravados nos meus, nem suspeita.... como me defenderei de um possível questionamento sobre doença mental, problemas psicológicos, trauma de infância, quando ele souber?
Eu que até esses meus vinte e oito anos já ouvi frases as mais agressivas e humilhantes ("não acredito", "que droga", "por que você não me falou antes?", "sai daqui", "você tá brincando, né bonitinha?", "ih, você precisa resolver esse problema logo"), estou mais escaldada que gato de mergulhador profissional.
Como irei lhe explicar que sempre tive muita, mas muita vergonha mesmo, de revelar por completo minhas infelicidades plásticas e que isso me fez chegar aos vinte e oito anos virgenzinha da silva?
Como fazê-lo crer que eu o tenho em altíssima conta, que o considero ideal para mim, tão carinhoso como é, que penso em me casar com ele, sem parecer precipitada? Valdemar me parece diferente de qualquer outro rapaz que tenha se interessado por mim. Será que ele vai ser cuidadoso ao resolver esse meu problema?
Está me olhando com uma cara de que sabe de tudo... posso até ver uns lampejos de piedade nos seus olhos. Será que ele está pensando que eu sou uma coitadinha indesejada e que ele vai me fazer o favor de realizar o serviço sujo de uma vez?
Mas por que ser virgem é um problemão se há muito pouco tempo todas as garotas tinham de ser puras, se não ai ai ai? Há trinta anos eu seria uma pérola de moça e hoje sou a rejeitada do Pari? Pensando bem, é muito atrevimento da parte dele ficar me olhando com cara de pena só por causa disso: quem ele pensa que é? Isso não é justo, nem certo: não tenho de me submeter aos costumes de meia dúzia de perdidas e alguns garanhões sem-vergonha! Tem cabimento eu ser anormal só porque sou virgem?
E tem mais, eu sei bem em que estado lastimável estão as partes pudendas das minhas amigas com vida sexual ativa: é candidíase, vaginite ulcerativa, cervicite erosiva, gardnerella vaginalis que não acaba mais! E dá-lhe tudo quanto é remédio: Gyno-Icaden, Gyno-Fungix, Gyno-Iruxol, Flagyl, Pletil, Flogo-Rosa, Zoltec, Zolzan, Zanzanenê... Quer saber? Não estou gostando nem um pouco dessa cara de dó que ele está fazendo para mim! Metidinho a gostosão! Eu sou é boa demais para esse cara!
— O que aconteceu, Lu?
— Acho melhor você ir embora.
— Mas que foi?
— Agora! Eu não vou ficar aturando mais essas coisas!
— Que coisas?
— Nada, nada! Vocês nunca sabem de nada, nunca fazem nada. São uns santinhos do pau oco. Vai embora, Valdemar, eu não quero mais ver você nem pintado de ouro!
— Você quer me fazer o favor de dizer o que que eu fiz?
— Mas você é muito cara-de-pau mesmo, hein? O que você fez? Você sabe muito bem o que todo mundo faz, o que você faz também: vai embora e vê se não aparece nunca mais na minha frente! Some, rua!
— Você tá louca, Lu?! Estava tudo bem e de repente você dá um pulo e começa a falar essas doideras!
— Claro, agora eu que sou louca, né? Vocês homens são todos iguais!
— Lu?!
— Não me chame de Lu, pra você eu sou Luciane, ou melhor: dona Luciane! Eu sei muito bem o que você está pensando: que se ninguém me quis até hoje é porque eu não valho a pena, é porque sou carne de segunda. Eu não sou um pedaço de carne de segunda, tá legal? Nem dura eu sou, tá vendo aqui? Sou mole, meu filho, bem mole! Eu sou um filé mignon!
— Do que você está falando???
— Ahá! Pensou que eu nunca iria adivinhar suas verdadeiras intenções? Enquanto você ia com a farinha eu voltava com a broa!
— Você precisa é de uma camisa-de-força. Eu vou embora!
— Vai mesmo! Você não tem mais nada pra fazer aqui agora que sua máscara caiu!
Ele foi embora. Está vendo como são todos os homens? Uns cafajestes que só pensam naquilo, não assumem um compromisso sério, não querem nada com a hora do Brasil e ainda ficam jogando na minha cara que eu sou gorda e virgem e não sirvo para eles...
Veja como são as coisas: eu quero, eu tento me relacionar, mas não encontro ninguém que preste neste mundo de meu Deus! Ninguém!

Autora: Stella Florence ( Texto tirado do livro "Hoje Eu Acordei Gorda" )

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